Minhas desavenças com as buzinas começaram como um item menor das minha lista de preocupações cotidianas, ou talvez apenas como um subitem da categoria “trânsito”. Isso quando eu ainda dirigia. Na minha vida de pedestre, a pendenga está quase chegando às vias de fato.
Sempre achei uma enorme grosseria buzinar no trânsito, a não ser que fosse para evitar que um motorista distraído (como eu) causasse um desastre de grandes proporções. Achava que era o equivalente a gritar na orelha de alguém que parou na sua frente na escada rolante. Pode ser irritante, mas dá pra contornar e xingar a pessoa mentalmente. Minha mãe faz a buzina psicológica. Quando está dirigindo e se assusta com alguma coisa, levanta a mão como se fosse buzinar, mas para bem no meio. Acho que mente se satisfaz, algo como o fumante que quer parar e fica com o cigarro apagado na boca.
Infelizmente, nem todo mundo é como mamis. Acho que dá uma coceira, a pessoa nem se dá conta mais quando aciona a corneta. Me irrito por mim mesmo, pela grosseria das pessoas, mas também porque o infeliz barulhento não se dá conta que tem gente que mora naquela rua, e que inclusive se dá ao luxo de dormir de vez em quando, em geral na hora em que ele resolveu amolar a vizinhança toda porque o carro da frente demorou uma fração de segundo além do tolerado por sua paciência para avançar no farol verde.
Como se vê, ultimamente minha tolerância está chegando perto de zero. Começou com um xingamento baixinho, contido. Depois passou pra uma coisa mais efetiva, mas que não atingia o ignorante. Mais recentemente, comecei a tentar “olhar na cara do sujeito”, essa expressão tão familiar a quem passou a adolescência indo de carro com o pai para o colégio. E depois passei a desejar que a janela do carro estivesse aberta, para que ele pudesse também ouvir os impropérios.
Hoje me vi na situação perfeita. Na subida da rua do Paraíso, uma senhora (eu achava elas tão pacíficas) não se conforma que o farol abriu e o trânsito não anda, e despeja a raivinha na buzina, janela aberta, e eu na calçada do lado certo, ainda por cima. Quando eu me preparava para minha primeira incursão no tête-a-tête anti-buzina, o carro da frente (o pobre alvo da revoltada) estanca no meio do cruzamento, o motorista põe a cabeça pra fora, esforçando-se para virar para trás, e grita: “Tá com pressa?”. E repete, completando aquela frase que eu achava que era só uma lenda, uma brincadeira que a gente fazia dentro do carro. “Tá com pressa? Passa por cima!”
Obrigado, meu São Longuinho. Não foi dessa vez que precisei pagar o mico de xingar um motorista no meio da rua. Fizeram isso por mim, economizei uns minutos de estresse. E eu que vivo pregando sobre as maravilhas de não ter carro, estou me desiludindo. Dirigir está dando nos nervos até de pedestre.
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